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Deparei-me com esta foto em outubro de 2004, no Rossio, Lisboa. Era uma das várias fotos enormes (formato 1,80m x 1,20m) de uma exposição chamada A Terra Vista do Céu, do fotógrafo francês Yann Arthus-Bertrand. Este sujeito passou anos a bordo de um helicóptero fotografando o mundo inteiro. Detalhes em [ http://www.yannarthusbertrand.com/ ]. As imagens extasiantes vinham combinadas com frases de cunho ecológico, social e político, que nos deixaram (estávamos por lá eu e meu mestre Manuel Veiga) boquiabertos, não por serem novidades mas exatamente por não serem.
Algumas delas:
“600 milhões de pessoas no mundo inteiro vivem em favelas nos arredores das grandes cidades.”
“No mundo, mais de 300.000 crianças, meninos e meninas, são soldados. Muitos deles têm menos de 10 anos.”
“Mais de um bilhão de pessoas não dispõe de decentes condições de vida.”
“Numa catástrofe natural, o número de mortos em países em desenvolvimento é 47 vezes
maior do que em países desenvolvidos.”
“Metade da humanidade vive com menos de 2 dólares por dia.”
“1 em cada 5 crianças não vai à escola.” “Um terço da superfície terrestre sofre de desertificação.”
“A indústria alimentar gasta 40 mil milhões de dólares por ano em publicidade.”
“A água insalubre provoca 5 milhões de morte por ano.”
“A espessura média da camada do gelo ártico passou de 3,2 m na década de 1960 para 1,8 m na década de 1990.”
“As emissões de CO2 produzidas pelas atividades humanas são responsáveis por mais de 60% do aumento do efeito estufa.”
“70% da água doce são usados para irrigar a terra cultivada e 80 países, ou seja, 40% da população mundial, sofrem de grave escassez de água.”
“A população mundial aumenta mais de um milhão de pessoas por semana.”
“Por ano 500.000 crianças ficam cegas por falta de vitamina A.”
“Para fabricar um computador são necessárias 8 a 14 toneladas de matérias primas não recicláveis.”
“40 milhões de pessoas morrem de fome por ano num mundo que produz 356 quilos de cereais por pessoa.”
“Um em cada cinco adultos no mundo não sabe ler ou escrever. Destes 90% vivem em países em desenvolvimento e dois terços são mulheres.”
“A quantidade de petróleo consumida em 6 semanas, metade da qual é usada em transporte, teria durado um ano inteiro em 1950.”
“2 espécies desaparecem por semana no mundo inteiro.”
“40% da população mundial não têm eletricidade.”
“Uma em cada três crianças com menos de cinco anos sofre de subnutrição.”
“No século passado a população aumentou 3 vezes, o consumo de água no mundo aumentou 6 vezes.”
“20% das pessoas que vivem nos países mais ricos consomem 60% da produção de energia comercializada no planeta.”
“90% da população mundial nunca fizeram uma chamada telefônica.”
“O total de despesa militar no mundo atinge 794 bilhões de dólares e a ajuda pública ao
desenvolvimento totaliza 58 bilhões de dólares.”
Ali senti Manuel muito tocado com as fotos e as frases. Nem eu nem ele seriamos mais os mesmos depois daquele dia. Grifei umas frases, não por considerá-las mais estarrecedoras que as outras mas por me fazerem refletir em primeira instância.Voltemos então à foto: o local em questão é uma aldeia haoussa em Niger, país sub-saariano do oeste da África. Fala-se que há evidências de seres humanos já habitarem certas regiões do país há 600.000 anos. Berço ou passagem de muitas etnias como Songhai, Mali, Gao, Kanem, Bornu e mais recentemente os Tuaregues, o Niger atualmente tem como etnia majoritária os Haoussas (cerca de 53% da população). O povo haoussa é conhecido pela qualidade de seu artesanato e pela sua habilidade para o comércio.
Não consegui a data exata em que a foto foi tirada, mas posso garantir que não passa de 10 anos. É impressionante verificar como ainda hoje vive este povo. Se houvesse tecnologia, esta fotografia poderia ter sido tirada há 2000, 5000 ou até mais anos atrás. A arquitetura é linda, com as casas contruídas em forma de cubo e os celeiros ovóides, com um material que é fruto da mistura de barro e fibras vegetais. As delimitações das “propriedades” também são um charme à parte. Os Haoussas desta aldeia, em plena era da Internet, não saíram do sedentarismo agrícola.
Se eu pudesse condensar o meu ano de 2005 em uma palavra, esta seria transformação. Aliás, nestes últimos anos acho que passei por mais transformações do que os Haoussas em milênios :-).
No nosso inevitável caminho ao encontro da felicidade, as transformações se fazem compulsórias e os erros e acertos vêm no bojo delas. Não tenhamos medo do futuro por mais conturbado que o presente seja. Por mais alarmantes que sejam as estatísticas ecológicas, sociais e políticas. Como dizem por aí, no final tudo acaba bem. Se assim não está é porque ainda não é o final. Miremo-nos na inabalável e milenar tranqüilidade do povo haoussa diante do mundo maluco que está em sua cercania. Sigamos firmes em busca dos nossos sonhos. Isto porém não quer dizer que, para tal, tenhamos de ficar inertes diante das vicissitudes do mundo. Tê-lo melhor deve ser o maior dos sonhos de cada um de nós.
Desejo a todos muita paz e alegria neste natal! Saúde, sucesso e felicidades em 2006!